Programa “Emprega + Mulheres” – Lei 14.457/2022, de 21 de setembro de 2022

Foi publicada em 21/09/2022, a Lei 14.457/2022, que institui o Programa “Emprega + Mulheres”, além de alterar a Consolidação das Leis do Trabalho.

A lei é a conversão da Medida Provisória 1.116/2022 com alguns dispositivos vetados, entrando em vigor imediatamente.

O Programa “Emprega + Mulheres”, estabelecido na lei em foco, tem por objetivo principal, segundo o seu artigo 1º, a inserção e manutenção de trabalhadoras no mercado de trabalho, com a implementação de medidas sociais, como o apoio à parentalidade (pais e mães) na primeira infância, pagamento de reembolso-creche e apoio a instituições de educação infantil.

A expressão “parentalidade” é conceituada na lei como o “vínculo socioafetivo maternal, paternal ou qualquer outro que resulte na assunção legal do papel de realizar as atividades parentais, de forma compartilhada entre os responsáveis pelo cuidado e pela educação das crianças e dos adolescentes, nos termos do parágrafo único do art. 22 da lei 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente).”

Não se trata, portanto, de lei que trate apenas do trabalho feminino e da proteção à maternidade, mas sim de diploma voltado à parentalidade, abrangendo, assim, os trabalhadores sob a ótica da maternidade e a paternidade, bem como filhos destes, além de flexibilizar regras trabalhistas para determinados grupos e condições, regrando alguns institutos da esfera da legislação do trabalho em vigor.

No campo das relações de trabalho, trata a lei do apoio à parentalidade por meio do reembolso-creche, sem natureza salarial e sem encargos, flexibilização do regime de trabalho, do regime de tempo parcial, do banco de horas, da adoção da jornada de 12×36, da antecipação de férias individuais (mesmo sem período aquisitivo completo) e da flexibilização dos horários de entrada e de saída do trabalho.

Quanto à qualificação profissional, a nova lei trata da inserção de mulheres em “áreas estratégicas” para a ascensão profissional e na criação da suspensão do contrato de trabalho para fins de qualificação profissional e no estímulo à ocupação por mulheres das vagas em cursos de qualificação dos serviços nacionais de aprendizagem, com priorização para “mulheres hipossuficientes”, vítimas de violência doméstica e familiar.

Além disso, aborda o tema do retorno ao trabalho das mulheres após o término da licença-maternidade, bem como a possibilidade de suspensão do contrato de trabalho de pais empregados, para acompanhamento do desenvolvimento dos filhos, além de estabelecer a flexibilização do usufruto da prorrogação da licença-maternidade da lei 11.770/08, tal como constava já na Medida Provisória 1.116/22 que deu origem à lei.

Cria, também, como forma de reconhecimento de boas práticas na promoção da empregabilidade das mulheres, a instituição do “Selo Emprega + Mulher”, assim como aponta caminhos aos empregadores para prevenção e combate ao assédio sexual e a outras formas de violência no âmbito do trabalho, mediante ações e novas atividades da CIPA das empresas, que passa a ser denominada “Comissões Internas de Prevenção de Acidentes e de Assédio”.

Disciplina, ainda, o estímulo e a concessão de microcrédito para mulheres.

Feito esse brevíssimo resumo, passamos à análise dos pontos e aspectos mais significativos da lei 14.457/22:

1.Reembolso Creche

A nova legislação autoriza as empresas a darem início ao pagamento de benefício de “auxílio-creche” para os empregados e empregadas que possuam filho de até 05 anos e 11 meses, sendo certo que o benefício será devido para reembolso e auxílio no custeio de creches e pré-escolas.

Se atendidos os requisitos legais, o referido benefício será considerado como verba indenizatória, ou seja, as empresas que optarem por conceder o “auxílio-creche” poderão fazê-lo sem que seja caracterizado como salário.

Ainda, foi exposto que as empresas que concederem o auxílio –creche ficarão desobrigadas da criação de espaço apropriado para a guarda e assistência de filhos de trabalhadoras no período de amamentação (obrigação existente para empresas com pelo menos 30 mulheres com idade superior a 16 anos – art. 389, §1º, CLT).

Trata-se, portanto, de uma autorização legislativa cujo principal intuito é fomentar o pagamento de mais um auxílio para a maternidade/paternidade, mas que se trata de um auxílio FACULTATIVO.

Importante destacar que, acerca desse benefício (reembolso creche), a Lei determina que Ato do Poder Executivo Federal disporá sobre os limites de valores, modalidades de prestação de serviços aceitas, inclusive sobre o pagamento de pessoa física.  Enquanto não existir esse Ato do Poder Executivo Federal, prevalece as condições estipuladas em acordo ou convenção coletiva de trabalho.

2. Flexibilização do regime de trabalho até que o filho complete certa idade: Teletrabalho; Horários especiais de trabalho; Banco de Horas; e Horários flexíveis de entrada e saída

A nova lei prevê que as empresas devem priorizar a concessão de teletrabalho, trabalho remoto e trabalho à distância, às empregadas e empregados que tiverem filho, enteado ou pessoa sob sua guarda, com até 06 anos de idade. Para os filhos com deficiência, não foi fixado limite de idade para priorização nessas modalidades de trabalho.

Está previsto, ainda, a possibilidade de negociação de trabalho em regime parcial (art. 58, CLT) e trabalho em regime de 12X36 (art. 59-A da CLT).

A negociação dos regimes especiais de jornada pode ser realizada com os empregados e empregadas que tiverem filho, enteado ou pessoa sob sua guarda, que poderá ocorrer até o 2º (segundo) ano do nascimento da criança, da adoção ou da guarda.

Importante destacar que a Lei fixa que as alterações de jornada deverão ser adotadas mediante Acordo Individual, Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) ou Convenção Coletiva de Trabalho (CCT).

Foi contemplada, também, que as empresas que adotarem o banco de horas com empregadas e empregados que tiverem filho, enteado ou pessoa sob sua guarda, em caso de rescisão do contrato poderão prosseguir com o desconto das horas negativas das verbas rescisórias, caso:

  1. haja pedido de demissão, ou;
  2. Não seja possível compensar as horas em período de aviso prévio, ou;
  3. Não haja interesse na compensação.

No que tange ao saldo positivo de horas, ele deverá ser quitado na rescisão de qualquer forma.

A lei é clara ao expor que a medida também é válida até o 2º ano do nascimento, adoção ou guarda da criança.

Por fim, ainda sobre o tema do regime de trabalho, constou expressamente na lei a possibilidade das empresas flexibilizarem os horários de entrada e saída dos trabalhadores que tiverem filho, enteado ou pessoa sob sua guarda, de até 06 anos de idade.

Assim, devem as partes ajustar novos horários ou períodos variáveis e flexíveis para de ingresso no trabalho.

3. Flexibilização na concessão de férias

A nova legislação prevê a possibilidade das empresas concederem férias antecipadas (antes mesmo do período aquisitivo completo) aos empregados e empregadas que tiverem filho, enteado ou pessoa sob sua guarda.

Registra-se que as férias não podem ser inferiores a 05 dias corridos, sendo necessário a concordância do empregador e empregado.

Existe previsão, ainda, que para esses casos, o pagamento das férias e 1/3 Constitucional poderão ter os seguintes limites máximos: As férias podem ser pagas até o 5º dia útil subsequente ao início da fruição;  O acréscimo de 1/3 Constitucional poderá ocorrer após o gozo das férias, com limite máximo de pagamento junto com o 13º salário (gratificação natalina).

Outra previsão interessante acerca da antecipação de férias, foi a possibilidade de desconto de valor de férias antecipadas fruídas das verbas rescisórias em caso de pedido de demissão.

A lei para essa situação também é clara ao expor que a medida é válida até o 2º ano do nascimento, adoção ou guarda da criança.

4. Medidas para qualificação de trabalhadores

Abrindo uma nova hipótese de suspensão do contrato de trabalho, estimulando a qualificação de empregadas mulheres e o desenvolvimento destas em habilidades e competências em áreas estratégicas ou com menor participação feminina, tais como, ciência, tecnologia, desenvolvimento e inovação, a lei estabelece agora que a empregada poderá solicitar a suspensão do seu contrato de trabalho para participar de cursos ou de programa de qualificação profissional sob responsabilidade do empregador.

A forma de suspensão observará o art. 476-A da CLT, ou seja, com suspensão de 2 a 5 meses, com duração equivalente à suspensão do contrato.

Tal suspensão de contrato poderá ocorrer via acordo individual entre empregador e empregada, acordo coletivo ou de convenção coletiva de trabalho, sendo que durante o período de suspensão do contrato de trabalho, a empregada fará jus à bolsa de qualificação profissional, sem prejuízo de espontâneo pagamento pelo empregador de uma ajuda compensatória, que não terá caráter salarial. O princípio básico, porém, é que a iniciativa da proposta de suspensão parta sempre da empregada (acordo individual) ou empregadas (instrumentos normativos), portanto, seja precedida de “requisição formal” das interessadas.

No caso de dispensa da empregada no transcurso do período de suspensão ou nos 6 (seis) meses subsequentes ao seu retorno ao trabalho, o empregador terá a obrigação de pagar à empregada, além das parcelas decorrentes da rescisão, uma multa a ser estabelecida em convenção ou em acordo coletivo, que será de, no mínimo, 100% (cem por cento) sobre o valor da última remuneração mensal anterior à suspensão do contrato de trabalho.

5. Medidas de apoio ao retorno ao trabalho da mulher, pós licença-maternidade

 A nova lei estabelece que, mediante ajuste entre empregado interessado e empregador, acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva, poderá ser suspenso o contrato de trabalho do empregado com filho, cuja mãe tenha encerrado o período da licença-maternidade, com o objetivo de o pai prestar cuidados e estabelecer vínculos com os filhos, acompanhar o desenvolvimento destes e apoiar o retorno ao trabalho de sua esposa ou companheira. Também, neste caso, deve existir prévia requisição formal ao empregador do empregado ou empregados referidos.

A suspensão deverá acompanhar os termos do art. 476-A da CLT, ou seja, suspensão pelo período de 2 a 5 meses mediante bolsa de qualificação, com participação do empregado em curso ou em programa de qualificação profissional oferecido pelo empregador e sem prejuízo de concessão espontânea de ajuda compensatória pelo empregador.

A carga horária máxima do curso será de 20 (vinte) horas semanais e será realizado, exclusivamente, na modalidade não presencial, preferencialmente, de forma assíncrona, ou seja, aulas gravadas disponibilizadas ao aluno em horários livres (videoaulas), sem interações ao vivo.

Nesse caso, também haverá sanção em caso de a dispensa do empregado ocorrer no transcurso do período de suspensão ou nos 6 (seis) meses subsequentes ao seu retorno ao trabalho, qual seja, pagamento de multa que será de no mínimo 100% (cem por cento) sobre o valor da última remuneração mensal anterior à suspensão do contrato. Valem aqui, portanto, as observações feitas anteriormente sobre os cursos de qualificação das mulheres.

Como obrigações do empregador a lei refere, ainda, a ampla divulgação aos seus empregados sobre a possibilidade de apoiar o retorno ao trabalho de suas esposas ou companheiras após o término do período da licença-maternidade, a orientação sobre os procedimentos necessários para firmar acordo individual para suspensão do contrato de trabalho com qualificação, e a promoção de ações periódicas de conscientização sobre parentalidade responsiva e igualitária para impulsionar a adoção da medida pelos seus empregados.

6.Selo “Emprega + Mulher”

A lei em exame institui o SELO “EMPREGA + MULHER”, com o objetivo de premiar as empresas que se destaquem pela aplicação dos princípios estabelecidos, objetivos da lei, conforme descrição de objetivos nela apontados, tais como, organização e manutenção de creches e boas práticas de empregadores.

As microempresas que se habilitarem ao recebimento do Selo, conforme regras a serem estabelecidas pelo Poder Executivo, serão beneficiadas com estímulos de crédito, enquanto as demais empresas detentoras do Selo poderão utilizá-lo para divulgação de sua marca, produtos e serviços, vedada a extensão do uso a empresas do mesmo grupo econômico não agraciadas com o Selo.

7. Outras disposições sobre igualdade salarial entre empregados e empregadas e ausências ao trabalho – Alterações na CLT

O art. 30 da lei em exame dispõe que “Às mulheres empregadas é garantido igual salário em relação aos empregados que exerçam idêntica função prestada ao mesmo empregador, nos termos dos arts. 373-A e 461 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo decreto-lei 5.452, de 1º de maio de 1943.”

O dispositivo na prática apenas atende ao clamor tão em voga no país de combater mais intensamente a diferença de tratamento salarial entre homes e mulheres, razão pela qual o mérito é o de reafirmar a necessidade de observar esse princípio.

Outra alteração da CLT, agora relativamente ao art. 473, é a mudança do inciso III, passando de 1 dia para 5 dias consecutivos, a contar da data do nascimento do filho, o direito de o empregado deixar de comparecer ao serviço, por nascimento de filho, acrescentando-se agora os casos de adoção ou de guarda compartilhada.

No mesmo art. 473, houve alteração no inciso X, passando de 2 dias para até 6 consultas e “pelo tempo necessário”, o que, na nossa interpretação, poderá ocorrer, por exemplo, em um turno de trabalho em cada ocasião, para o empregado acompanhar sua esposa ou companheira em consultas médicas, ou em exames complementares.

 

Dra. Renata Heloise Cassiano Casachi | OAB/SP n.º 311.914 | Advogada e Assessora Jurídica | Especialista em Advocacia Trabalhista e Direito Constitucional | Perita em Cálculos | Atuante em Direito Civil, Família/Sucessões e Consumidor.

 

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