Empresas que possuem marcas semelhantes podem coexistir no mercado?

A proteção conferida à marca consistente no direito de uso exclusivo submete-se ao princípio da especialidade, ou seja, essa proteção jurídica conferida pela lei é restrita ao ramo de atividade em que o seu titular atua, com exceção da marca de alto renome, a qual possui proteção em todos os ramos de atividade.

Segundo a doutrina do renomado Fábio Ulhoa Coelho: “A proteção da marca se restringe aos produtos e serviços com os quais o mercado pode ser confundido pelo consumidor. Se não houver a possibilidade de confusão – isto é, de o consumidor considerar que o fornecedor de certo produto ou serviço é o mesmo ramo de outro com marca igual ou semelhante -, não decorrerá do registro nenhum direito de exclusividade. O INPI classifica as diversas atividades econômicas de indústria, comércio e serviços, agrupando-as segundo o critério da afinidade, em classes, que auxiliam a pesquisa de possíveis fontes de confusão. O titular do registro de uma marca terá direito à sua exploração exclusiva nos limites fixados por este critério. Não poderá, por conseguinte, opor-se à utilização de marca idêntica ou semelhante por outro empresário se estiver afastada qualquer possibilidade de confusão. Exceção feita, apenas, ao titular de marca de alto renome, cuja proteção se estende a todos os ramos de atividade econômica.”

Nesse sentido já decidiu o E. Superior Tribunal de Justiça (STJ) em casos semelhantes:

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 2068036 – RJ (2022/0033796-2). DECISÃO: Trata-se de agravo contra decisão que negou seguimento a recurso especial interposto em face de acórdão assim ementado:

APELAÇÃO – PROPRIEDADE INDUSTRIAL – DIREITO MARCÁRIO – MANTIDA SENTENÇA – ANULAÇÃO PARCIAL DE REGISTRO DE MARCA – POSSIBILIDADE DE CONVIVÊNCIA – ATUAÇÃO EM CLASSES E RAMOS COMERCIAIS DISTINTOS – MARCA NOTORIAMENTE CONHECIDA – NÃO INCIDÊNCIA DO ART. 126 DA LPI – APELAÇÃO DESPROVIDA.

Nas razões de recurso especial, alega a parte agravante violação dos arts. 126 e 128, § 1º, da Lei 9.279/96, e 6º, bis, da Convenção União de Paris. Sustenta que a marca de sua titularidade é notoriamente conhecida e deve ser tutelada contra atos de aproveitamento parasitário promovidos pela agravada. Assim posta a questão, verifico que o recurso especial não dispensa o reexame de prova. As razões da agravante partem do pressuposto de que a marca de titularidade da agravada é nula, por reproduzir a marca notoriamente conhecida utilizada pela primeira e, assim, violar o direito de exclusividade, contrariando, também, o princípio da especialidade. A respeito dessa premissa fática, porém, confira-se o seguinte trecho do acórdão recorrido (e-STJ, fl. 449): (…) no caso dos autos, as atividades prestadas pela apelante e pelas Tecnologias Associadas e Franchising LTDA. EPP. são inegavelmente distintas e não colidem entre si, não havendo qualquer impedimento para coexistência entre as marcas homônimas, na forma pretendida. A apelante é titular de marcas para identificar produtos de vestuário, enquanto a 2ª recorrida é titular de marca para assinalar serviços de gerenciamento e licenciamento de marcas e patentes de terceiros, gestão de franquia, assessoria na implementação de franquia, isto é, atividades de cunho eminentemente auxiliar ao gerenciamento de ativos empresariais de terceiros. É cristalino que as marcas com conflito destinam-se a públicos diversos, além de não possuir qualquer grau de relação direta no mercado. Deste modo, verifica-se que, na prática, os segmentos de mercado não se confundem, devendo ser aplicado ao caso o princípio da especialidade, segundo o qual a exclusividade de um signo se esgota nas fronteiras do gênero de atividades que ele designa. (…) As marcas notoriamente conhecidas, que gozam da proteção do art. 6º bis, 1, da CUP, constituem exceção ao princípio da territorialidade, isto é, mesmo não registradas no país, impedem o registro de outra marca que a reproduzam em seu ramo de atividade. Ademais, não se confundem com a marca de alto renome, que, fazendo exceção ao princípio da especificidade, impõe o prévio registro e a declaração do INPI de notoriedade, gozando de proteção em todos os ramos de atividade, tal como previsto no art. 125 da Lei n. 9.279/96.(…) Desta forma, o art. 126 dispõe que a marca que for notoriamente conhecida em seu ramo de atividade goza de proteção especial naquele segmento de mercado. Constata-se, portanto, que não houve violação ao art. 126, vez que, conforme já verificado, as marcas em conflito não possuem qualquer grau de relação direta no mercado. Não há como afastar essas conclusões em recurso especial, consoante dispõe a Súmula 7 do STJ. Em face do exposto, nego provimento ao agravo em recurso especial. […]Intimem-se. Brasília, 19 de setembro de 2022. MARIA ISABEL GALLOTTI Relatora (AREsp n. 2.068.036, Ministra Maria Isabel Gallotti, DJe de 26/09/2022.)

Assim, tendo em vista o princípio da especificidade é possível registros iguais em diferentes setores (ramos diferentes), porém, não há possibilidade de registro de uma marca com o mesmo nome de outra que atua no mesmo segmento.

Dra. Bruna Parizi | OAB/SP n.º 313.667 | Procuradora Legislativa | Advogada | Especialista em Direito Administrativo | Atuante em Direito Civil, Família/Sucessões e Consumidor

 

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